quinta-feira, março 01, 2007

Cinema

Wa Wa We Waa


Muita gente vai querer pegar uma carona no sucesso de Borat

É indiscutível: Borat é o maior fenômeno cinematográfico desde a trilogia O Senhor dos Anéis. O personagem de Sacha Baron Coen está na boca do povo, basta abrir os jornais para vê-lo fazendo graças. E estas não mais se limitam ao caderno de cinema. Borat faz incursões pela seção política, páginas de informática (ele foi fenômeno no YouTube) além de fazer a alegria de chargistas de plantão. Baron Coen deixou de ser cult. É ícone pop.

Embora sejam exagerados os rótulos de “filme mais engraçado de todos os tempos”, é difícil encontrar alguma produção recente que possa rivalizar com a jornada do repórter cazaque em matéria de humor. Borat – O segundo melhor repórter do glorioso país Cazaquistão viaja à América, é um falso documentário, e seu protagonista aproveita a alienação e o preconceito dos norte-americanos para destilar a melhor crítica ao american way of life perpetuada durante a administração Bush. Borat e seu produtor Azamat Bagatov (Ken Davitian) são os únicos personagens fictícios do longa, interagindo com pessoas reais, que realmente acreditavam participar de um documentário “sério”, produzido para ser exibido no Cazaquistão.

A jornada de nosso herói começa quando o governo do Cazaquistão, país mostrado como uma nação extremamente atrasada, decide enviar Borat à América para aprender costumes que possam ajudar no progresso do “glorioso país Cazaquistão”. O personagem de Baron Coen, por sua vez, não poderia ser mais caricato. Suas atitudes bárbaras, como lavar o rosto no vaso sanitário ou guardar suas fezes em um saco plástico são pra lá de inverossímeis, exceto para quem realmente acredita que estes são hábitos comuns no Cazaquistão. Com o sucesso dos trailers na Internet o governo cazaque se apressou para desmentir as alegações de Borat, o que gerou ainda mais publicidade parar o longa. Mas se Baron Coen era tido como inimigo número um do país pouco antes da estréia de Borat, hoje sua criação é bem quista no país, graças ao aumento do turismo proporcionado pelo longa.

A sorte de Baron Coen é que boa parte dos americanos caiu como patinhos em suas piadas e citações anti-semitas. Alguns se colocaram de prontidão para tentar “civilizar” o pobre imigrante culturalmente inferior e ajudar no progresso do Cazaquistão. É impressionante notar que os americanos realmente acreditam estar num patamar superior ao restante da humanidade.

Também ajuda a simpatia que Coen confere à sua criação. Borat é dono de uma ingenuidade pra lá de cativante, o que possibilita que a maioria das pessoas levem na esportiva as brincadeiras do ator, pois consideram que ele não sabe ao certo o que diz. Tudo fica melhor quando o exacerbado anti-semitismo, homofobismo e machismo do personagem encontram eco em seus entrevistados, provando o quanto os americanos são parecidos com aquele sujeito de modos tão “atrasados”. Em um momento Borat diz que no Cazaquistão todos os homossexuais são condenados a morte, sendo de pronto respondido por um sulista típico: “estamos tentando isto aqui também”.

Apesar dos melhores momentos do longa estarem na interação entre Borat e suas “vítimas”, Coen prova ser um humorista de raro talento também para o humor tradicional ao conferir uma trama linear para a narrativa. Apaixonado pela figura de Pamela Anderson, “uma mulher diferente de tudo que existe no Cazaquistão”, Borat cruza a América na esperança de torná-la sua esposa. O plot, apesar da simplicidade, garante espontaneidade ao longa, justificando entrevistas e encontros pelo país. O comediante também mostra talento para desferir piadas escatológicas, uma atrás da outra, ajudado por Azamat. A química dos dois em cena é fantástica, e o contraste entre o improviso que Coen faz durante suas entrevistas e a mise-en-scène das cenas só aumenta a graça de toda a piada. Destaque para a luta que ambos protagonizam no hotel, completamente nus. Engraçadíssimo.

Além de fazer rir, Borat consegue atestar uma teoria que a muito tempo defendo: mesmo os improvisos devem ser planejados. Explico. Coen fez diversas pesquisas antes de sair as ruas, testou o personagem em seu programa de TV The Ali Show, e por fim tentou prever todas as respostas possíveis para cada uma de suas gracinhas, visando nunca perder a espontaneidade. Além do empenho neste método, também deve ser louvada a imerção do ator no personagem. Mesmo nas situações mais difíceis, como as diversas vezes em que acaba preso, Coen nunca abandona o personagem. Inclusive, são nestes momentos de aperto que surgem algumas das melhores piadas do longa.

Infelizmente, graças a febre em que se transformou, Borat provavelmente nunca mais poderá realizar suas entrevistas. A máscara de Coen caiu, e agora é preciso recorrer a outras criações. É o caso do repórter de moda Brüno, que logo deve alcançar a telona. Tomara que o mundo da moda seja tão engraçado quanto a América de Bush.

Nenhum comentário: