quinta-feira, junho 20, 2013

Um país em chamas

Outro dia brinquei com um amigo que meu medo era ver as manifestações que começaram inspiradas em "V de Vingança" (V, por sua vez, inspirado em Guy Fawkes) darem lugar a ações inspiradas no Coringa do filme "Batman - O cavaleiro das trevas ressurge". Pois foi exatamente o que vi hoje in loco na Praça dos Três Poderes, que vivenciou momentos de caos dignos de Gotham City.

Verdade que muitos foram protestar contra alvos bem definidos: os favoritos, de longe, Marco Feliciano e Renan Calheiros. Outros tantos foram gritar contra tudo e todos, do Estado à iniciativa privada, passando pela imprensa. Os mais exaltados desse último grupo estavam ávidos por passar por cima de algo, fosse o que fosse. Como não foi possível tomar o Congresso Nacional, romperam contra o Itamaraty, mas poderia ter sido um ministério, uma van da imprensa ou lojas de grife, se elas ali estivessem.

A opção pelo Itamaraty foi matemática. Além de ser o alvo mais próximo (pelo menos do lado em que eu estava), era certamente o que renderia mais flashs. Paradoxal que, em meio a gritos de fora Rede Globo, o sonho de muitos ali fosse aparecer no Jornal Nacional (ou, na pior das hipóteses, "bombar" no Instagram). Tiveram seus quinze minutos de fama.

Hipocrisia querer creditar o ato vazio e idiota à direita ou à esquerda. "Sem partido", todos já devem saber, é o mote da vez, tendo sido entoado junto a uma série de outros refrões espirituosos.

Mas não foi tudo em vão. Ficarão na memória os coros pedindo que tudo transcorresse "sem violência" e "sem vandalismo", bem como a solidariedade do vinagre - sim, ele aplaca a ardência provocada pelo gás lacrimogêneo -, repassado de mãos em mãos em meio a fugas até certo ponto ordenadas. "Sem correria, pessoal", ouvia-se enquanto bombas caiam e a tropa de choque avançava, em surpreendente demonstração de autocontrole, que, infelizmente, faltou a parte dos ali presentes.

O que fica de bom da experiência? A percepção de que uma geração injustamente tida como acomodada está em ebulição.

Difícil é prever o que entornará desse caldeirão.

Foto: Gustavo Froner/Reuters