sábado, março 28, 2009

Cinema

Em time que está ganhando...


Eastwood com um trabuco na mão: cena emblemática do cinema ianque

Sempre me impressiona o fato de Clint Eastwood conseguir emendar bons lançamentos em espaços tão curtos de tempo. Como aos melhores vinhos, a idade tem feito bem ao velho caubói. Seus últimos filmes conseguem sempre figurar entre os melhores lançamentos do ano e, o mais impressionante, entre os melhores da carreira do próprio. Porém, o mais instigante nessa história toda – pelo menos para mim – é o fato de Eastwood conseguir nos surpreender mesmo sendo extremamente redundante em suas obras. Gran Torino, novo longa do diretor, talvez seja o melhor exemplo disso.

O protagonista, Walt Kowalski, é um veterano da guerra da Coreia que acaba de perder a esposa. Típico exemplar do americano branco cristão, em alguns momentos ele aparenta ser não mais que um estereótipo: não gosta de imigrantes; acha que a mulher deve ser subverniente ao homem; não compreende os jovens e tampouco se conforma com a decadência americana configurada nos últimos anos. O cinéfilo mais atento certamente sabe que essas são adjetivações recorrentes no cinema de Clint. E o próprio Kovalski mais parece uma mistura de outros personagens encarnados pelo diretor. Estão lá facetas do justiceiro Dirty Harry, do treinador-tutor Frankie Dunn (Menina de ouro), do caubói descrente Bill Munny (Os imperdoáveis), entre outros.


"Não, não Thao, você não é o Menino de ouro!!!"

Kowaski é o último de sua leva em um bairro dominado por imigrantes orientais. A família o considera um velho rabugento, e não esconde a ansiedade em o ter debaixo da terra. Sozinho, ele só tem alento nas tarefas rotineiras, que incluem jardinagem e cuidar de sua relíquia automotiva, um Gran Torino 1972 original. Não que ele quisesse alguma proximidade dos vizinhos, que ele despreza. O problema é estes passam a vê-lo como herói depois que ele salva os irmãos Sue e Thao de gangues do bairro. Aí a história ganha contornos parecidos com os vistos em Menina de ouro. Sue torna-se uma inusitada amiga, graças à coragem e petulância da garota em confrontar Walt – como a boxeadora Maggie Fitzgerald do longa supracitado. Thao transforma-se em pupilo, última esperança de Walt em criar um descendente que honre os valores nos quais acredita.

Gran Torino constrói-se nessa necessidade mútua de Thao e Walt, em que um precisa de uma figura paterna e o outro de uma nova chance para criar um filho. Tal qual Menina de ouro. Trama e personagens podem não ser originais na filmografia do cineasta, mas o maior mérito de Clint como diretor não é surpreender. Seu talento reside em saber contar uma história em todas as suas nuances, na mise en scène apuradíssima, nos pequenos detalhes e na incrível dedicação em tornar suas narrativas as mais verdadeiras possíveis. Eastwood surpreende sim, mas pela perseverança, pois, perto dos oitenta anos, não mostra sinais de preguiça ou de ego inflado, mas sim uma incrível dedicação aos pequenos detalhes e diferenças que tornam cada obra única e relevante.

quarta-feira, março 11, 2009

Cinema

Em celulóide


A "adptação impossível" é muito boa, mas não é perfeita.

Wacthmen, a HQ, é uma obra especial para mim. Tanto que passei os últimos três dias queimando neurônios no afã de encontrar a melhor forma de começar esta resenha sobre Watchmen – O filme. Caso tivesse embarcado na empreitada instantes depois da sessão, iniciaria atacando o diretor Zack Snyder, por omitir algumas das partes que mais gostava no quadrinho. No dia seguinte, sábado, já tendo esfriado um pouco a cabeça, adotaria um tom mais ameno: o de decepção, pois filme não representará para o cinema aquilo que representa para os quadrinhos. Na segunda-feira, com tudo melhor digerido e após muita reflexão, enalteceria a coragem de Snyder em adaptar para a telona um texto tão complexo e de pouco apelo comercial. E de forma bastante fidedigna.

Agora me parece claro que Snyder se sairia melhor na função de produtor do longa. Não que ele seja um diretor ruim, não é este o caso. A questão é que o estilo caricato dele não combina com o clima realista e reflexivo da HQ em vários pontos. Um bom exemplo é a cena em que Walter Kovacs explica como se tornou Rorscharch. Nela, Snyder faz uso do seu habitual gosto pela violência crua e gráfica ao colocar o herói matando o bandido à machadadas, em momento digno de Jason Vorthes – ou seria Chucky, o brinquedo assassino? No original, Rorscharch queima o bandido e observa a cena de longe.

A crueldade do quadrinho é a mesma – quem sabe até maior – porém, na HQ a cena nos é apresentada com sutileza. Não há a preocupação em mostrar um corpo humano se desfazendo em chamas. A atenção é centrada no olhar do anti-herói,
frente ao fogo, distanciado, o que aumenta o impacto da transformação do homem comum com uma máscara em um novo ser, que julga entender a maldade humana e saber como lidar com esta. Como esperar que o público reflita sobre algo do tipo quando a versão de Snyder arranca risos da platéia?


Cenas como essa dizem muito sobre a profundidade de Watchmen.

Snyder provou que a história de Watchmen cabe em um filme. É verdade que algumas passagens fizeram falta, principalmente para alguém que já perdeu as contas de quantas vezes leu o original, mas a essência da narrativa foi preservada. Graças à postura de fã adotada pelo diretor, que batia o pé cada vez que os executivos almejavam mudar o contexto, almejando ganhar a simpatia do espectador médio.

Watchmen não foi concebido para tal público, e Snyder sempre soube disso. Mesmo fãs de gibis mais tradicionais já torciam o nariz para toda aquela profundidade, um universo no qual é difícil determinar as fronteiras entre bem e mal, esquerda e direita, humano e divino, só pra citar algumas. Dessa forma, nada melhor do que ver essa história contada por um diretor que também fugisse da média. Alguém com traços mais “kubrickianos” e que não se perdesse nos detalhes. Aronofsky talvez? Não sei. O certo é que Snyder ainda não está nesse patamar (visionário? só para o departamanto de marketing da Warner). Admirador e bom-entendedor do quadrinho que é, ele deveria ter percebido e admitido isso, entrado no projeto como produtor para garantir a fidelidade e encontrado alguém com estilo mais próximo à essência do texto de Alan Moore. É claro que versão é vesão, cada um faz a sua, e agora não adianta chorar. Nem é preciso, uma vez que o trabalho de Snyder é, de fato, bem aceitável – em sua maioria, transposição literal. Um filme nota 7 (talvez 8 com a versão estendida) de 10. Fidelidade por fidelidade, sejamos fiéis à HQ, que é nota 11!


"Aí gata, curtiu o filme? Que tal agora batermos em alguém pra relaxar?"

sexta-feira, março 06, 2009

Cinema

Cosmética da fome


Danny Boyle pasteuriza a pobreza a ponto de transformá-la em diversão?

Excelente a crítica Pablo Villaça sobre Quem quer ser um milionário?. Ele insere o longa de Danny Boyle no conceito da "cosmética da fome", várias vezes utilizada para rechaçar algumas produções nacionais. A análise de Pablo sai, até certo ponto, defasada - quase todo mundo já tinha escrito algo sobre o filme -, provando que, quase sempre, o tempo é aliado do crítico. De nada adianta se esforçar para ser o primeiro a postar impressões sobre uma obra se estas não vão além de obviedades. Também é curioso notar que muitos dos que aplaudem Quem quer ser um milionário? reclamam da produção cinematográfica brasileira, que insiste em mostrar o que o Brasil tem de pior... Coincidência?

O link para a crítica do Pablo.