quarta-feira, dezembro 31, 2008

Cinema

Melhores do Ano - Parte 1

Último dia do ano, época mais que propícia para rememorar os destaques de 2008. E um blog chamado Script!, que se propõe a falar sobre cinema, não pode se omitir de listar os melhores momentos da sétima arte neste moribundo ano.

Um ano que ficará marcado pela queda de bilheteria e qualidade dos lançamentos nacionais, pela falta de bons lançamentos no segundo semestre (culpa da greve dos roteiristas no começo do ano, lembram?) e pelo sucesso de filmes violentos e sombrios. Aliás, o filme para toda família parece ser uma espécie em extinção, superado pela tendência de segmentação do mercado.

Começo destacando os talentos responsáveis pela qualidade do que assistimos. Atores, atrizes e diretores que tiveram um brilho especial e ofuscaram seus pares por onde andaram.

Melhor Ator

Daniel Day Lewis (Sangue negro)

Uma escolha um tanto óbvia, visto que Day Lewis já abocanhou o Oscar e o Globo de Ouro por sua performance em
Sangue negro. Prêmios pra lá de merecidos. Lewis simplesmente materializou toda a ganância e falta de escrúpulos do American Way of Life em seu Daniel Plainview, magnata do petróleo que é capaz de tudo para garantir o lucro dos negócios. Embora Plainview seja uma figura detestável, que remete até mesmo a Geroge W. Bush, a composição de Lewis é perfeita ao ponto de enchergarmos humanidade na figura do prospector.

1 – Daniel Day Lewis (Sangue negro); 2 – Robert Downey Jr. (Homem de ferro); 3 – Viggo Mortensen (Senhores do crime); 4 – Josh Brolin (Onde os fracos não têm vez); 5 – Jean Claude Van-Damme (J.C.V.D).

Melhor Atriz

Laura Linney (A família Savage)

Depois de assistir a
A família Savage fui tomado por um sentimento misto de curiosidade e preocupação: como continuaria a vida de Wendy Savage após as viradas do final do filme? Ora, preocupar-se com a trajetória de um personagem que nem ao menos existe é sinal de que nutrimos toda uma empatia por aquele. E como não gostar de Wendy, uma personagem tão complexa que parece existir fora das telas? Mérito da soberba interpretação de Laura Linney, que constrói em apenas duas horas uma personalidade real, com todas as nuances que deixam as pessoas tão imprevisíveis e interessantes.

1 – Laura Linney (A família Savage); 2 – Ellen Page (Juno); 3 – Carice Von Houten (A espiã); 4 – Julianne Moore (Ensaio sobre a cegueira); 5 – Letícia Sabatella (Romance).

Melhor Ator Coadjuvante

Heath Ledger (Batman: O cavaleiro das trevas)

Se existe uma premiação aguardada para o próximo Oscar, ela é a de ator coadjuvante. Isto porque Heath Ledger realizou um dos trabalhos mais perfeitos já vistos na tela grande. O ator personificou o Coringa em uma versão ainda mais aterradora que a dos quadrinhos, em uma atuação que servirá como modelo para construção de vilões para todo o sempre. Mas quis o destino que Ledger não vivesse para conquistar os louros pela performance.
Como premiá-lo sem que isso soe piegas? Sempre existirão aqueles que questionarão a imparcialidade da homenagem póstuma. Uma injustiça, que só pode ser corrigida assistindo-se mais uma vez a Batman: O cavaleiro das trevas.

1 – Heath Ledger (Batman: O cavaleiro das trevas); 2 – Javier Barden (Onde os fracos não têm vez); 3 – Ben Foster (Os indomáveis); 4 – Paul Dano (Sangue negro); 5 – Tom Cruise (Trovão tropical).

Melhor Atriz Coadjuvante

Penélope Cruz (Vicky Cristina Barcelona)

Penélope Cruz é famosa por suas recorrentes parceirias com o diretor Pedro Almodóvar, de quem sempre ganha papéis expressivos. Provavelmente foram estes papéis que chamaram a atenção de Woody Allen, que deu à atriz a personagem Maria Helena, que parece saída de um filme de Almodóvar. O bom disso tudo é que Penélope pode pisar em um terreno rasoavelmente conhecido, ma sem nunca se repetir. A atriz rouba
Vicky Cristina Barcelona para si toda vez que entra em cena, mesmo formando um triângulo amoroso com gente da estirpe de Javier Barden e Scarlett Johansson.

1 – Penélope Cruz (Vicky Cristina Barcelona); 2 – Tilda Swinton (Conduta de risco); 3 – Saoirse Ronan (Desejo e reparação); 4 – Maggie Gyllenhaal (Batman: O cavaleiro das trevas); 5 – Natalie Portman (Um beijo roubado).

Melhor Diretor

Andrew Stanton (WALL-e)

Difícil encontrar hoje um estúdio que dê tanta liberdade criativa e apoio aos seus realizadores quanto a Pixar. Nesta, são artistas, e não executivos engravatados, quem planejam os filmes. Com tanta liberdade e com um time de primeira para tocar os projetos, é até natural que ela emplaque o melhor diretor para
Script! pela segunda vez consecutiva. Andrew Stanton realizou WALL-e de forma primorosa, sem se render a nenhuma convenção mercadológica. WALL-e é puro cinema de autor, dialoga, simultaneamente, com clássicos do cinema mudo e da ficção científica, possui personagens encantadores e ainda por cima consegue tecer uma profunda crítica contra o consumismo dos dias atuais. Algo assim só é possível quando tocado por mãos talentosas como as de Stanton.

1 – Andrew Stanton (WALL-e); 2 – Christopher Nolan (Batman: O cavaleiro das trevas); 3 – Irmãos Coen (Onde os fracos não têm vez); 4 – Paul Thomas Anderson (Sangue Negro); 5 – Jason Reitman (Juno).

quarta-feira, dezembro 24, 2008

Televisão

Adeus ano velho

O tempo passa e não tem jeito: só me dou conta de que mais um ano está acabando quando vejo a propaganda do especial do Roberto Carlos na televisão. Nada mais sintomático para ilustrar a mesmice que anda nossa televisão... Mas ao final do ano sempre é bom dar uma olhadinha para trás e lembrar as coisas boas que vivenciamos. 2008 pode não ter sido um poço de originalidade, mas, justiça seja feita, até que teve bastante coisa legal na telinha...


O ano começava muito bem com a minissérie Queridos Amigos

A começar por Queridos Amigos, minissérie global que aportou em meados de janeiro. O texto traçava um perfeito perfil da geração que combateu a ditadura e depois precisou encontrar o próprio lugar na nova aurora democrática. A grande sacada da autora Maria Adelaide Amaral foi aproveitar as experiências pessoais para criar um texto de apelo universal, mostrando que a amizade é a base de sustentação para qualquer geração. O elenco inspiradíssimo (impossível citar destaques em um todo não perfeito) compensou a avareza da globo, que limitou os recursos da produção, deixando muitas cenas com cara de novela.


Um doce para quem adivinhar o final de Lost!!!

Ainda no início do ano tivemos a quarta temporada de Lost. Os detratores que me perdoam, mas o seriado merece sim todo o oba-oba que tem em torno de si. Depois de quebrarem a cabeça dos fãs com intrincados flashbacks durante as temporadas anteriores, Damon Lindelof e J.J. Abrams deram um drible de mestre e mudaram todas as expectativas ao mostrarem a vida dos personagens após deixarem a ilha. Com o advento dos flashfowards deixamos de nos preocupar se os personagens sairão da ilha para nos concentrarmos no mistério maior: afinal de contas, o que é tudo aquilo. Isso sem mencionar o impactante season finale, provavelmente o melhor na história da TV americana.


Na minha modesta opinião, a melhor de todas as séries!

Falando em TV americana, em 2008 ela trouxe para nós o término da terceira temporada de My name is Earl bem como o início da quarta. Correndo o risco de soar repetitivo, mais uma vez enalteço o trabalho da equipe de roteiristas e do produtor Greg Garcia. Não bastasse terem criado um mote sensacional (karma!) e contarem com alguns dos protagonistas mais hilários já vistos na TV, eles povoaram a série com o melhor time de coadjuvantes que já vi!!! A mitologia que cresce a cada episódio chega a lembrar um pouco Os Simpsons, e seu enorme elenco de coadjuvantes. Isso sem contar o elenco talentosíssimo, em especial Ethan Suplee (Randy), Jaime Pressly (Joy) e Jason Lee (Earl). Difícil acreditar que Hollywood ainda não tenha se tocado do talento desses caras!


Finalmente uma animação que faz jus ao rótulo de "Espetacular"

No campo da animação, destaco o O espetacular Homem-Aranha. Finalmente a Marvel acertou a mão no terreno dos desenhos animados, brindando-nos com uma produção tão boa quanto as da Warner/DC. A fórmula foi pegar aquilo que melhor funcionou em cada versão do personagem (o original dos quadrinhos; a versão Ultimate; o desenho anterior e, é claro, os filmes), misturar tudo e dar uma seqüência lógica para o desenvolvimento de Peter Parker como super-herói. O resultado foi a melhor versão do aranha já feita em qualquer mídia! O design limpo concebido por Sean Galloway somado ao texto preciso faz de O Espetacular Homem-Aranha uma das animações do ano.


E não é que a ginga brazuca chegou até os animês?

Eu disse “uma das”? Pois é. O Aranha não leva a taça sozinho porque neste fim de ano me deparei com uma verdadeira obra prima vinda do Japão. Falo de Michiko to Hatchin, anime que, vejam só, é ambientado na realidade brasileira, tem favelas (fictícias) como cenário e samba e bossa nova como trilha sonora. Michiko é uma criminosa malandra, gente boa, daquelas que só o Brasil produz. Ela quer reencontrar seu grande amor, dado como morto há 11 anos. Pra isso ela seqüestra Hatchin, suposta filha do rapaz, que tem, vejam só, 9 anos e vinha sendo criada como escrava por um padre. Basta uma olhadinha no trailer para ver que a produção é de primeira!!! Recomendadíssimo!


Cansado dos insossos Casseta & Planeta e JN? Ligue no CQC!

Pra terminar, volto a TV brasileira, na qual destaco o humor inteligente do CQC e o refinamento estético de Capitu, de Luiz Fernando Carvalho. Já falei sobre o CQC, mas não custa repetir que o programa é o sopro de vida que faltava ao humor e ao jornalismo (sim!!!) brasileiro. Irreverência somada a uma intransigência positiva, algo pra lá de necessário em um país de escândalos sucessivos. Carvalho é outro que já conquistou elogios do blogueiro, mas com Capitu ele se superou. O casamento da estética teatral do diretor funcionou perfeitamente com o texto de Machado de Assis, e o que vimos foi a melhor homenagem que o autor poderia ganhar no centenário de sua morte. Pena que boa parte do público brasileiro não esteja preparada para apreciar plenamente a beleza de uma obra como esta. Pudera, basta assistir ao restante da programação para constatar como é baixo o parâmetro de nossa televisão...


Que bom seria se todos os programas tivessem o texto de Machado...

terça-feira, dezembro 02, 2008

Cinema

Nuances do amor


Moura e Sabatella: os melhores atores do cenário nacional?

Guel Arraes e Jorge Furtado são verdadeiros heróis do cinema nacional. Guerreiros da resistência, pregam um cinema feito para nosso público, o brasileiro comum, sem apelar para reciclagens de obras televisivas. Mas nem isso os protegeu de críticas contra o estilo “televisivo” que adotaram para suas obras. Uma injustiça, visto que a dupla domina, sim, a linguagem cinematográfica,mas de um jeito bem peculiar, diga-se de passagem. Um estilo próprio, que os diferenciam de primos americanos e europeus, caracterizando uma escola genuinamente brasileira.

Romance, a mais nova empreitada desses desbravadores, traz todos os elementos característicos no trabalho da dupla. Estão lá o bom humor, em diálogos rápidos e inspiradíssimos; a metalinguagem pra lá de recorrente nos roteiros de Furtado e o fascínio de Arraes pelo Nordeste brasileiro. O curioso é que, embora o preserve o estilo, Romance soa como uma reinvenção para a carreira da dupla. O tom mais sério destoa da essência farsesca dos filmes anteriores de Arraes (autor de O auto da compadecida e Lisbela e o prisioneiro) ou mesmo da visão mais caricata do mundo presente nos filmes de Furtado (como em O homem que copiava e Meu tio matou um cara).

Essa transição representa um grande risco para dois cineastas que têm seus nomes sempre relacionados a sucessos de bilheteria (deixemos de lado o fraco desempenho de Saneamento básico de Jorge Furtado). Apesar do título, Romance não é um filme recomendável para fãs de açucaradas comédias românticas. Aqui, o amor é discutido de maneira séria. E não só amor entre um casal, mas também o amor pela arte.

Para tanto, o célebre conto de Tristão e Isolda é transformado no propulsor que faz a trama girar. Pedro (Wagner Moura, mostrando-se dono de um talento monstruosamente versátil) é um diretor de teatro que se apaixona por Ana (Letícia Sabatella, finalmente bem aproveitada na telona) atriz que escolhe para viver Isolda em sua montagem. O diretor dá vida a Tristão, dentro e fora da peça, uma vez que o amor que fisga o casal protagonista se confunde com o dos personagens seculares.


Qual a fronteira entre sentimento e atuação?

Os problemas surgem quando Ana é convidada por Danilo (José Wilker) para estrelar a próxima novela das sete. Ele aceita, pensando em como a exposição na TV ajudará na divulgação da peça, que anda mal das pernas. Mas o novo trabalho traz consigo os empecilhos de uma agenda lotada, que gera os ciúmes de Pedro, para quem não basta a fidelidade ao companheiro. É preciso manter-se fiel ao teatro. Os dois separam-se para só voltarem a se encontrar três anos depois, ao decidirem ambientar o conto de Tristão e Isolda com temática nordestina, para um especial de TV.

Furtado e Arraes são suficientemente hábeis em construir toda a trama em cima do texto de Tristão e Isolda sem que isso lhes impusesse amarras criativas. Um MacGuffin é tão somente um... MacGuffin! Contar mais que isso estragaria um filme que consegue surpreender o espectador a cada reviravolta, mesmo abraçando um gênero cada vez mais marcado pela previsibilidade. Andrea Beltrão, Vladimir Brichta (muito bem), Bruno Garcia e Marco Nanini (sempre bem) completam o ótimo elenco.

Minha única crítica reside na fotografia do longa. Ela não é ruim, mas não explora o potencial da tela grande do cinema, sugerindo um verdadeiro descuido técnico. O excesso de closes de rostos funciona bem no espaço reduzido da televisão. No cinema, serve para alimentar o arsenal de gente que não gosta do cinema nacional pelo simples fato de este ser brasileiro.

PS: Aos frequentadores assíduos dessas mal traçadas linhas, peço descupas pela demora desta atualização. A temporada de provas do final de ano não deu trégua. Espero que dezembro me ajude a compensar esse deslize. Com a ajuda de vocês, é claro!!!