terça-feira, janeiro 29, 2008

Cinema

Guerra de sexo


Verhoeven segue a risca sua receita de mesclar sexo e violência

Paul Verhoeven é um pervertido, na acepção mais elogiosa que a palavra pode receber. Seu fascínio por violência e sexo nos garantiu pérolas como O vingador do futuro, Tropas estelares e Instinto selvagem, todas repletas de sangue e libido, sempre com muito impacto visual e sem papas na língua. O estilo inconfundível também moldou os controversos O homem sem sombra e Showgirls, sendo que o último, mesmo sendo defenestrado constantemente em relações de filmes ruins, ainda conseguiu atrair um séqüito de fãs fervorosos, tudo graças ao trato que o diretor possui com cenas pra lá de “picantes”.

A espiã, sua mais nova empreitada, felizmente fica mais próxima do primeiro grupo. A produção marca o retorno de Verhoeven à sua Holanda natal e à temática da Segunda Guerra, retratada no clássico Soldado de laranja. A violência faz-se presente, é claro, mas o tom estilizado que nos acostumamos a ver nas obras do cineasta dá lugar a uma abordagem mais realista das barbáries cometidas por Nazistas e Aliados, um esforço claro para permanecer neutro, longe do maniqueísmo que costuma rondar produções desse tipo, potencializado por um roteiro que constantemente força a protagonista a rever conceitos e analisar o caráter dos companheiros.

Ellis, vivida magistralmente por Carice van Houten (já terei visto a melhor interpretação de 2008!?) é uma judia que luta para escapar da perseguição alemã na Holanda de 1944. Em uma fuga mal sucedida, ela testemunha a execução brutal de diversos judeus, entre eles, sua família. A dor da perda alimenta um revanchismo que faz a moça juntar forças à resistência holandesa. Eles propõem que ela se aproxime de um comandante alemão que demonstrou claro interesse pela bela figura de Ellis disfarçada como ariana legítima. O problema é que o oficial em questão pode não ser o real inimigo, o que obrigará nossa heroína a redobrar o cuidado em todas as frentes
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Carice van Houten é o grande achado da produção

Se Verhoeven puxou um pouco o freio na violência para soar mais realista, no campo do sexo ele engata a sétima marcha. A espiã está longe de ser uma “pornochanchada” como Showgirls, mas depende em demasia da sexualidade para o desenvolvimento da trama. Ellis está disposta a tudo pela missão, o que fica claro na seqüência em que ela tinge os pêlos pubianos para disfarçar sua origem racial, mostrando que dormir com o inimigo é um sacrifício calculado.

Verhoeven consegue imprimir um ritmo instigante à trama e suas incontáveis reviravoltas, mas não atinge a perfeição de outrora por conta de certos deslizes narrativos, em especial o envolvimento afetivo de Ellis com seu espionado, que soa forçado por dar-se de maneira abrupta e, até certo ponto, inexplicável. O diretor pode argumentar que é impossível explicar a natureza de uma paixão e suas nuances. No amor, na guerra e também no cinema de Verhoeven, vale tudo.

Mas estes são apenas alguns pormenores que não tiram o brilho do retorno de um dos cineastas mais marcantes da virada dos anos oitenta para os noventa. Verhoeven prepara-se agora para voltar a Hollywood, no comando da superprodução Thomas Crown 2. Ele pode voltar sem o prestígio dos tempos áureos, mas traz na bagagem uma produção que atesta sua competência em fazer cinema de qualidade.

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